Amarílis mediando debate, na Feira Pan Amazônica, em Belém |
Quando fui convidada a proferir
palestra em Paragominas, franzi a cara. Quê, vencer rumas de estradas, cinco
horas, numa van? Mas fui, a van confortável, se não entupida de um material de
uma trupe de teatro de marionete, o “Bricabraque”, que alegrou o 1º Salão do
Livro de Paragominas. Mesmo assim, a viagem foi tranqüila, eu no banco da
frente, ao lado do Paulo Ivan, atento, paciente, o cauteloso motorista do
veículo, responsável por uma viagem até repousante. E, lá fomos, mais os do “Bricabraque”,
Francisco, o diretor e mentor do grupo, Vanessa, Gabriel, John e Malu, eles
enfiados entre seu mar de objetos.
Parênteses para dizer do esforço
desses artistas que movem os fios de um mundo de faz de conta, lindinho, uma
perfeiçãozinha, os bonecos, lindeza à parte, arte em papel machê. Linda, a
concepção e encarnação dessas personagens, as vozes, o fundo musical, as
músicas incidentais, a iluminação do cenário, o colorido dos jogos de luzes, a
adaptação do texto de Esopo, os efeitos cênicos. Já em Paragominas depois da
trabalheira da montagem do palco, pais, mães, gurizadas, netos e bisnetos
curtiram o espetáculo. Tudo bem e bom no “Bricabraque”, apesar da necessidade
de menos didatismo, de lição de moral explícita, de advertências morais, algo
que os infantes não percebem muito, o que se daria com maior proveito, se expresso
no fluxo da ação dramática. Abri parênteses, porque se trata, no Pará, do único
grupo dedicado ao teatro de marionete, seus mantenedores a dar duro, a labutar
na marra, um grupo que necessita de apoio e estímulo, que precisa ser admirado
pela beleza do espetáculo e pela carência de artistas dedicados ao antigo
ofício.
Fechado os parênteses,
atravessamos rumo ao Pará-nordeste, a estrada ótima, péssima só no trecho perto
de Belém entre o município de Santa Izabel e a Vila de Americano. Por que o
sacrifício dos sacolejos perto da capital? Descaso, inoperância, administração
falha?
Atravessa-se até Paragominas, o
olhar preso a uma triste constatação. Os municípios atravessados abrem uma
paisagem inóspita, calcinada, as margens da BR-010, a Belém-Brasília, repletas
de queimadas, mata esturricada, prova de deseducação ecológica e de que esses
locais não contam com projeto de arborização, manifesta o descaso ante o
desflorestamento crescente da Amazônia, alguns lugarejos tinindo, escaldando, o
povo queimando à falta de um verde mínimo, de uma pálida rama contra o calor e
a inclemência do sol. O que se vê são descampados sem fim, belas visadas a
perder de vista, é certo pastos intermináveis, o belo feio da morte da Terra,
pasto onde dormita boi escasso e magro. Pra quê tanto descampado, tanta flora
destruída, tanta natureza morta, enjeitada, desprezada, tratorada, para nela se
plantar o desalento de diminutos rebanhos? Passa-se estrada e, é essa a realidade.
Os caras desmatam tudo. Não vêem bois apinhados sob raras sombras. Em alguns
municípios plantaram uns eucaliptos, umas palmeiras imperiais que amargam falta
de trato.
E chega-se a Paragominas, à
surpresa, árvores meio crescidas ou a crescer por todo canto, a cidade a
verdejar, a atmosfera pujante, saudável. Um adendo: não sou amiga nem de bom
dia do prefeito, cujo nome desconheço. Reporto-me ao que vi, senti: uma promissora,
cuidada, atrativa Paragominas, que deveria ser espelho de boa administração. Se
eu fosse o governador Jatene, dava uma prensa nos prefeitos que abandonam seus
municípios ao que der e vier. Organizava-lhes um estágio de lição de vergonha
na cara, uns dias de permanência em Paragomninas. “Vamos lá, prefeitos, ver
como renasceu um município-problema”, caso de Paragominas.
A cidade nasceu quando Juscelino
Kubitschek, em 1958, pediu a Magalhães Barata, governador do Pará, doação de
terras ao usufruto de um grupo de mineiros e goianos desejosos de viver no
Pará. Barata cedeu mata fechada, parte de São Domingos do Capim e de Viseu. Tudo
foi projetado, o traçado da cidade por arquitetos paulistas e o nome do lugar
que, em 1965, elevou-se a município de Paragominas. só que, em poucas décadas,
devastara 8,4 km² da floresta. Caiu em lista negra, foi punido. Amargou fracasso.
E deu-se um pacto firmado por um lúcido prefeito em defesa do desmatamento
zero, intento alcançado. Hoje, ali, há ruas limpas, asfaltadas, rótulas
respeitadas, transito ordeiro, administração atuante. E árvore, árvore. Imaginem
que a prefeitura comprou um Parque quase pronto, de herdeiros. São 12 mil
hectares com alamedas, arvoredo, animais livres, ao centro um belo lago com
pedalinhos gratuitos à população que frui do recanto, uma das sete maravilhas
do Pará, por eleção popular patrocinada por O Liberal.
O Salão do Livro abrigou-se no
parque e é flagrante o orgulho na face da população que ajuda a cuidar do
espaço. Paragominas devia ser modelo até a Belém, espelho da inconsciência de
devastar, não cultivar. O Salão brilhava em Paragominas, eu surpresa com a
pujança do município que venceu, matou o atraso.
Amarílis Tupiassú é doutora em
Letras
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